Virgínia era
uma esperta menininha da cidade grande, ingênua e doce. Tinha apenas 5 anos, os
quais passara observando o mundo através da janela do seu apartamento em uma
grande metrópole. Ela estava ávida por conhecer o novo mundo que se apresentava
para ela ante a vida no campo.
Seus pais
resolveram trocar a vida urbana pela rural, pois haviam comprado uma fazenda.
Logo que chegou
na fazenda, a garotinha quis conhecer todos os animais que nunca vira antes em
sua vida, a não ser em revistas, livros, TV ou outros. Ela gostou de todos, mas
se encantou mesmo foi com um bichinho branquinho, peludo, de orelhas grandes e
olhos vermelhos. E Virgínia logo perguntou:
- Que animal é
você, fofinho?
O coelho,
orgulhoso como era, não acreditava que a garotinha não conhecesse um coelho.
Ele aproveitou que estava sozinho - pois a coelha estava em outra parte da
fazendo com seus filhotinhos recém-nascidos – e respondeu cinicamente à
garotinha:
- Eu sou um
macaco!
Virgínia tão
pura e crédula lhe fala:
- Já ouvi
histórias de macaco, mas nunca havia visto um, nem mesmo em fotos.
Mas o coelho
mais ainda se indignou com a pouca fama de sua espécie entre as crianças da
cidade grande, que completou:
- Eis então o
primeiro! E ao vivo e a cores!
Virgínia ficou
encantada por conhecer um macaco, e como se afeiçoara por ele, passou a
visita-lo todos os dias. E o coelho manteve sua identidade de macaco, e assim
se relacionou normalmente com a menina.
Cada dia mais a
menina gostava mais do seu amigo macaco, e meses se passaram, até que um dia,
os pais de Virgínia lhe falam sobre um torneio anual que havia na pequena
cidade próxima à fazenda, onde havia uma competição de animais de diversas
espécies, entre eles: coelhos. Seu pai então lhe falou:
-Filha, vamos
inscrever seu amigo coelho na competição, para que você o leve. O antigo dono
da fazenda ganhou vários prêmios com ele.
A menina sem
entender então respondeu:
- Se houvesse
uma competição para macacos eu iria.
Os pais
acreditando ser coisa da imaginação fértil de uma criança, só riram, e a mãe
disse:
- Não filha,
não há competição para macacos.
Os pais não
insistiram com Virgínia, pois não sabiam que ela não distinguira um coelho de
um macaco, e também não estavam muito empolgados com essas competições que
haveriam. Só se interessavam mesmo em assistir o evento e passear juntos.
Virgínia então
foi correndo ao macaco que apelidara de Floquinho(assim como muitas crianças
gostam de nomear os coelhos) e contou sobre a competição da qual seus pais
falaram. De repente os olhos do coelho brilharam e as lembranças em sua mente o
fizeram viajar, e ele se dera conta de quem era, e o que estava fazendo, então
desabafou:
-E se eu te
disser que sou um coelho Virgínia?
E a garotinha
gargalhou:
- O que é isso
Floquinho? Você é um macaco!
- Não Virgínia,
eu menti pra você: eu sou um coelho!
- Não, você é
um macaco. Porque resolveu agora ser coelho?
- Porque eu sou
um coelho!
- Você é um
macaco!
- Coelho!
- Macaco!
- Coelho!
- Macaco!
E a discussão
durou um bom tempo, e Virgínia não convencera Floquinho de que ele era um
macaco, e nem ele a convencera de que na verdade era um coelho.
Anos se
passaram, Virgínia foi à escola, cresceu, e descobriu que realmente Floquinho
era um coelho, mas aí já era tarde demais. Porém no fundo, ainda há a suspeita
de que Virgínia ainda desconfie da verdade...
Às vezes
mentiras são sustentadas por tanto tempo e com tanta “veracidade”, que as
pessoas duvidam da verdade quando ela é dita. E as pessoas que mentem por muito
tempo acabam sendo vítimas de suas próprias mentiras. Algumas se envolvem tanto
nelas, que tem dificuldade para discernir a verdade da mentira, pois passam até
a acreditar nela.
E afinal, o que
leva alguém a contar a verdade após tanto tempo alimentando uma mentira: a dor
do outro ou o prejuízo para si próprio?
Veja o exemplo
do poeta Fernando Pessoa. Ele tinha vários heterônomos, e ainda há estudiosos
que acreditam que o próprio nome Fernando Pessoa era também um deles. Um de seus heterônomos, Álvaro de Campos,
assina o poema Tabacaria, no qual, descreve a perda da própria identidade ao
sustentar uma mentira. Um conflito que se acredita que ele realmente vivia,
baseada nos seus múltiplos heterônomos. Veja um trecho:
Vivi,
estudei, amei e até cri,
E
hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
(...)Fiz
de mim o que não soube
E o
que podia fazer de mim não o fiz.
O
dominó que vesti era errado.
Conheceram-me
logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando
quis tirar a máscara,
Estava
pegada à cara.
Leia
o poema Tabacaria, de Fernando Pessoa, na íntegra: http://www.insite.com.br/art/pessoa/ficcoes/acampos/456.php
Brunna Stefanya Leal Lima Cabral
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Obrigada!
muito bom!a verdade é sempre melhor ainda q nos traga alguma complicação no momento;a mentira só retarda a complicação;porque a verdade sempre dá um jeito de aparecer.
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